Mentes brilhantes

Jovens paranaenses desenvolvem projetos científicos e contribuem para o desenvolvimento social 

Folha de Londrina | 6 de abril de 2009

Pesquisas, leituras e grupo de estudos. Conhecimento a respeito de normas científicas, leis, entrevistas, funcionamento de mecanismos e produção de artigos. Esta é uma rotina comum a pesquisadores, mestres e doutores, empenhados em descobertas e análises profundas sobre diversos temas. Em geral adultos, estes pesquisadores ganharam a companhia de jovens também interessados pelo mundo científico.

Eles têm 15, 16 anos, mas se comportam como gente grande quando o assunto é o conhecimento. O passeio experimental pela escola em uma cadeira de rodas mostrou aos estudantes Gabriel Tadeu Sanson, 15, e Bruno Abdala Cândido Lopes, 16, as dificuldades enfrentadas pelos cadeirantes nas ruas. Depois de algumas pesquisas, a possível solução que os adolescentes encontraram para os desafios à acessibilidade foi a criação de um dispositivo de baixo custo. Ele permite a subida das cadeiras no meio-fio, uma das principais queixas ouvidas pelos jovens nas entrevistas.

Durante a realização do trabalho, a dupla conversou com fisioterapeutas e cadeirantes e também conheceu as leis de acessibilidade. Estudantes do curso de Engenharia da Universidade Positivo (UP) deram dicas de como inserir um dispositivo nas cadeiras de rodas disponibilizadas pelo Sistema Único de Saúde (SUS), para que pacientes de baixa renda tenham acesso à tecnologia.

O projeto deu certo e agradou muitos cadeirantes. Além do trabalho, a oportunidade de conversar com os cadeirantes e os novos conhecimentos sobre leis de acessibilidade deram aos jovens Bruno e Gabriel uma experiência que será levada para a vida. ”Eu não parava para pensar nas dificuldades que os cadeirantes enfrentam”, lembra Bruno. ”O que valeu do projeto foi ajudar as pessoas. Mexeu bastante comigo”, fala, com orgulho e brilho nos olhos, o estudante Gabriel.

Para chegar a resultados tão expressivos, a preparação não é fácil. Os estudantes se empenham – e muito – em pesquisas, leituras e conversas com especialistas na área. Esta maratona de conhecimento também foi vivida pelos colegas Rhayssam Poubel Arraes e Susan Amaral, ambos de 15 anos.

Embasado em literaturas utilizadas no ensino superior, Rhayssam buscou respostas a uma dúvida que teve aos 13 anos. ”Tive a preocupação com o tipo de jovem que está sendo criado. Porque existe uma grande preocupação com o corpo perfeito, um erotismo cada vez mais cedo. Como o jovem está filtrando tudo isso?”

Foi assim que surgiu o projeto ”Mídia televisiva: mãe dos sete pecados”. A argumentação de Rhayssam é de que a televisão, presente na maioria dos lares brasileiros, exerce uma grande influência na formação de crianças e adolescentes, o que deveria ser amenizado com a participação dos pais. ”É uma ação conjunta, nos lares, com os pais orientando os filhos a filtrarem as informações e despertando o senso crítico”, explica.

”Você sabe o que acontece com um psicopata quando é preso?”, perguntou a um professor a futura psiquiatra Susan. A partir desta dúvida, a adolescente iniciou uma pesquisa sobre um assunto polêmico: o tratamento a psicopatas e maneiras de evitar que a doença se manifeste.

O projeto ”Interface entre Lei e Psiquiatria: é possível tratar a mente de psicopatas?” mostra que predisposições genéticas ou eventos ocorridos durante o desenvolvimento podem causar o comportamento de um psicopata. Porém, segundo ela, esta doença pode ser evitada com a identificação de seus sintomas durante a infância. ”Existe cura e prevenção para a doença. A visão do psicopata é errada, a maioria das pessoas não tem ideia da definição de um psicopata”, defende Susan.

Acelerador de partículas foi tema de estudo em Toledo
Aluno de uma escola pública no município de Toledo (Oeste), Leandro Volanick, 16 anos, estudou as experiências realizadas na Europa com aceleradores de partículas, o que poderia causar o chamado buraco negro. ”Se a experiência desse errado iria criar o buraco negro, que é como uma estrela que explode e atrai tudo para si. Mas não houve problema nisso”, explica o jovem, que fez o estudo com outros dois colegas de classe.

Mesmo sem contar com projetos de estímulo à pesquisa científica, os estudantes utilizaram os laboratórios de física e foram orientados por professores da disciplina. ”Eles mostravam o caminho e a gente ia atrás”, lembra Leandro, que pesquisou o assunto desde quando entrou no ensino médio.

O exemplo destes adolescentes mostra que qualquer jovem interessado em realizar pesquisas pode chegar muito longe. Com a participação em projetos escolares ou não, a iniciativa pode contagiar professores e alunos. Foi o que aconteceu em Toledo. Depois do êxito em seu projeto, Leandro e seus colegas foram convidados a organizar uma feira de ciências na escola.

Todos os jovens entrevistados participaram da edição 2009 da Feira Brasileira de Ciências e Engenharia da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (Febrace), realizada março, na USP. O evento reuniu estudantes do ensino fundamental e médio de todo o Brasil para apresentarem seus projetos na área de Engenharia e Ciências Exatas, da Terra, Biológicas, de Saúde, Agrárias, Sociais e Humanas.

‘O Brasil precisa de pesquisadores’
A psicóloga e psicanalista Shirlei Rialto Sesarino garante: todos podemos nos tornar cientistas. Ela explica que, de acordo com os estudos psicanalíticos, a predisposição à elaboração de pesquisas e estudos nas mais diversas áreas descarta uma interferência genética.

”Todos têm potencial, somos aparelhados para fazer qualquer coisa”, afirma. Ela ressalta que a formação durante a infância estimula ainda mais a curiosidade e o interesse por respostas. Isso acontece quando a pessoa está segura de seu espaço, principalmente junto à família.
Shirlei acredita que o envolvimento de jovens em projetos científicos não é prejudicial, desde que o adolescente não se sinta violado. ”Não podemos generalizar, mas para alguns este envolvimento também pode ser uma fuga de outra situação que está difícil de tratar”, complementa.

O professor Celso Hartmann, coordenador da Mostra de Soluções para uma Vida Melhor, das Escolas Positivo, acompanhou o desenvolvimento dos projetos de Gabriel, Bruno, Susan e Rhayssam. Um dos argumentos que mais utiliza em sala de aula para envolver os alunos é um cenário nacional. ”O Brasil precisa de pesquisadores e pessoas com novas idéias. Temos muitos problemas e poucas pessoas interessadas em como resolvê-los”, afirma.

Para o professor, um retorno positivo da participação dos alunos em projetos científicos é uma mudança de postura, que às vezes vale muito mais do que uma nota 10 no boletim. ”Eles percebem que podem ter sucesso, serem úteis para a sociedade. Fico apaixonado. Se 10% dos nossos alunos se envolverem, o mundo vai ficar melhor.”